A alguns amigos, adeus.
Dependendo do resultado da eleição, pode ser que não nos vejamos por muito tempo ou, quem sabe, nunca mais. Talvez, por conta do meu hábito de ter opinião própria, fartamente catalogado em texto, áudio e vídeo, eu seja obrigado a me exilar; ou, quem sabe, serei morto, preso, ou desaparecido, como é comum nas ditaduras que dizem proteger o “cidadão de bem”. Talvez vocês até fiquem indignados quando isso ocorrer, mas não será por muito tempo. Rapidamente colocarão a culpa da minha fatalidade em mim mesmo, por nunca saber a hora certa de me calar.
Dependendo do resultado que sair das urnas no próximo 30 de outubro, talvez eu enlouqueça, consumido pelo fardo de viver num projeto de cleptocracia miliciana pentecostal, cujo maior sonho é restaurar a escravidão, a subserviência feminina e a autocracia descarada. Talvez, nesse caso, até nos vejamos. Talvez vocês passem por mim pelas ruas e encontrem traços meus no rosto de um sem teto, vagando perdido numa névoa mental. Talvez vocês até me reconheçam, mas nada farão, e eu, tomado pela loucura, nem vou lembrar que um dia os conheci.
Dependendo de quem for eleito em 2022, talvez eu vá à falência, destituído da possibilidade de trabalho e renda por ter opiniões diferentes da “maioria conservadora e silenciosa”. Assim, precisarei me esconder num lugar distante onde me misturarei à grande massa oprimida que nunca teve uma chance. Talvez, um dia, num posto de beira de estrada, numa praia durante as suas férias, ou numa rua vazia, eu passe pedindo esmolas ou vendendo algo que não irão comprar. Vocês poderão até me reconhecer, mas a vergonha os fará fingir que nunca me viram. Afinal, a culpa é minha por não desenvolver os méritos certos que me permitiriam ser merecedor da sua próspera amizade.
Em todos esses casos, estaremos distantes, mais distantes do que agora. Separados não só por diferenças de opinião, mas por ódio, cercas e guardas armados, que um dos possíveis vencedores da próxima eleição irá certamente utilizar. Por isso, digo um adeus antecipado a todos os amigos que se consideram moralmente superiores e acreditam saber qual é a parte certa da população que deve ser presa, morta ou exilada.
Eu, ao contrário, não acredito que haja gente melhor ou pior; eu não concordo que a exclusão e a discriminação sejam a forma de construir um país melhor; enfim, eu não sou um de vocês, o tal “cidadão de bem”.
A esses amigos, adeus.
Mas, saibam, não precisa ser assim. Vocês podem mudar de ideia. Podem perceber que a escolha que estão fazendo vem de um ódio (in)consciente:
ao povo, que consideram receber benesses demais de um governo que deveria valorizar mais a elite da qual acreditam fazer parte;
a mulheres, que um dia os traíram ou não os amaram como esperavam;
ou a grupos minorizados, que, acreditam, ameaçam direitos seus que, cá entre nós, sempre foram apenas privilégios decorrentes de séculos de opressão.
Mesmo os que se dizem politicamente neutros, alardeando a sua misantropia, não o fazem racionalmente; o fazem por falta de amor próprio.
Enfim, essa mensagem não precisa ser um adeus, essa mensagem pode ser um até logo. Só depende de vocês. Querem continuar conversando comigo, ou preferem, por conta de motivos vis e banais, me calar para sempre?
Aos demais amigos, continuamos juntos. Na melhor e na pior; no exílio, na clandestinidade; na loucura ou na miséria. Ou num país melhor que precisaremos reconstruir, pois, acredito, ainda temos chance de nos regenerar.
Torço pela segunda opção. Torço pela segunda opção.
Sobre o Lançamento de A Década Perdida
Nem tudo são tristezas, no dia 15 de outubro fiz, aqui no escritório, o lançamento de A Década Perdida. Ao contrário do que a metereologia previu, abriu um solão e pude receber amigos para bater papo e tomar uma cerveja. Os que vieram ganharam uma foto instantânea, ideia roubada da paulamaria, uma edição especial de O Salvadorenho e um adesivo.
Muito obrigado a todos que apareceram ou mandaram mensagens. É um prazer escrever para vocês. :-)
Ainda não comprou A Década Perdida? Não seja por isso. Ainda restam algumas cópias na editora. Clique aqui e garanta a sua.
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Por falar nisso
Não é primeira vez que falo adeus para alguns desses amigos. A primeira vez foi no whatsapp.
Engraçado como eu sempre tive essa fama de comunista, mesmo sem ser
Seja como for, o fato é que, como dizia Lou Reed, cabô o tempo. Hora de decidir de uma vez por todas o que queremos ser enquanto nação.
E, sim, essa não é uma boa semana pra parar de beber ou fumar.
Mas, é uma boa semana pra continuar no desafio #literoutubro. Venha fazer parte dessa nação.
No mais, é isso e um bom voto.
Espero que, nesse halloween, a gente tenha conseguido espantar os monstros que dominaram o nosso país por tanto tempo.
Saravá!
Lisandro Gaertner
vai dar!
tem que dar!